quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Biografar ou não biografar


Parece que o Chico Buarque errou. Esqueceu que foi entrevistado em 1992, quem sabe até não exclusivamente sobre Roberto Carlos, parece que foi uma longa entrevista, deve ter falado de muita coisa. Deve ter dado muitas entrevistas nessas duas décadas, mesmo sendo um dos artistas menos oferecidos que se conhece. Tudo bem, meus olhos devem ser benevolentes e ele não deveria ter desmentido o entrevistador sem ter certeza. Tomara que se retrate, mas eu, que sou mais nova que ele, já estou meio esquecida, portanto mesmo não achando certo, compreendo. Sei que ele acertou tanto, mas tanto na vida, que eu não faria desse episódio um cavalo de batalha. Artistas verdadeiros são seres esquisitos, costumam pecar por excesso de humanidade - errar não é humano? - melhor seria manter muito mais proximidade com suas artes do que com suas vidas, talvez por isso suas biografias sejam tão temidas por eles próprios e suas famílias. Eles se conhecem. Sabem das suas glórias, do talento que os faz particulares e de suas fraquezas, iguais às dos que não vivem sob um facho de luz. E conhecem, também, a mediocridade alheia. Acabei semana passada de ler 1808, não deixa de ser uma biografia de D.João VI e sua turma, e comecei a ler uma biografia de Nat King Cole que tenho guardada há tempos, e tenho uma do Cole Porter na fila. Gosto de história, e de biografias. Pelé, que é o Pelé, foi execrado por uma frase em uma entrevista. Tomara que esse assunto seja bem resolvido, mas sugiro deixar os artistas em paz, e continuar enriquecendo a vida com suas artes. E olha que já tive vontade de quebrar os CDs do Caetano, e não foi agora. Não quebrei, e não quebrarei.

Não defenderia censura. Também não pretendo concordar em nada com a Paula Lavigne, mas a próxima crítica que me aparecer contra o Chico, vai me fazer desistir de desejar biografias de quem não quer ser biografado. E de pensar sobre o desejo e o direito de guardar para si a própria vida. Até que ponto o interesse de alguns, mesmo que muitos, pode agredir quem quer preservar sua privacidade? Não quero saber da vida do Chico. E quero continuar admirando ele. E diante da enxurrada de críticas, e até de gente que acordou só agora para defender liberdades, quando ele já brigava por elas, não consigo deixar de lembrar, com tristeza, do Tom Jobim dizendo que fazer sucesso no Brasil é pecado mortal.