terça-feira, 3 de julho de 2007
Banda Larga Cordel
(Gilberto Gil)
Pôs na boca, provou, cuspiu.
É amargo, não sabe o que perdeu.
Tem o gosto de fel, raiz amarga,
Quem não vem no cordel banda larga
Vai viver sem saber que o mundo é o seu.
Tem um gosto de fel, raiz amarga,
Quem não vem no cordel da banda larga.
Vai viver sem saber que o mundo é o seu.
Uma banda da banda é umbanda,
Outra banda da banda é cristã,
Outra banda da banda é cabala,
Outra banda da banda é alcorão.
E então, e então, são quantas bandas?
Tantas quantas pedir meu coração.
E o meu coração pediu assim só:
Bim-bom, bim-bim-bom, bim-bão,
Todo mundo na ampla discussão.
O neuro-cientista, o economista,
Opinião de alguém que está na pista,
Opinião de alguém fora da lista,
Opinião de alguém que diz não.
Ou se alarga essa banda e a banda anda
Mais ligeiro pras bandas do sertão,
Ou então não, não adianta nada,
Banda vai, banda fica abandonada,
Deixada para outra encarnação.
Ou então não, não adianta nada,
Uma vai, outra fica abandonada,
Os problemas não terão solução.
Piraí, Piraí, Piraí,
Piraí bandalargou-se há pouquinho,
Piraí infoviabilizou
Os ares do município inteirinho.
Por certo que a medida provocou
Um certo vento de redemoinho,
Diabo do menino agora quer
Um ipod e um computador novinho.
O certo é que o sertão quer navegar
No micro do menino internetinho.
O Netinho, baiano e bom cantor,
Já faz tempo tornou-se um provedor
– provedor de acesso
À grande rede www.
Esse menino ainda vira um sábio
Contratado do Google, sim sinhô!
Diabliu de menino internetinho,
Sozinho vai descobrindo o caminho,
O rádio fez assim com o seu avô.
Rodovia, Hidrovia,
Ferrovia e agora chegando a infovia,
Pra alegria de todo o interior.
Meu Brasil, meu Brasil, bem brasileiro
O You Tube chegando aos seus grotões,
Veredas dos Sertões, Guimarães Rosa,
Ilíadas, Luzíadas, Camões,
Rei Salomão no Alto Solimões,
O pé da planta, a baba da babosa,
Pôs na boca, provou, cuspiu,
É amargo, não sabe o que perdeu,
É amarga a missão, raiz amarga,
Quem vai soltar balão na banda larga
É alguém que ainda não nasceu...
É amarga a missão, raiz amarga,
Quem vai soltar balão na banda larga
É alguém que ainda não nasceu...
segunda-feira, 2 de julho de 2007
Sanatório Geral
Tenho um sobrinho que, ainda bem pequeno, quando encontrava alguém da família logo avisava, mantendo a devida distância: “Não gosto de beijos”.
Já eu, gosto de beijos, mas descobri que não gosto de elogios. Achei que era por overdose – passei a vida coberta por eles, menina bonitinha, simpática, cuidadosa e obediente. Só bem mais madura consegui uma pista para entender porque é que eles me pesavam tanto. O Ministério da Saúde deveria advertir: elogio pode causar dependência. Aprecie com moderação.
Carinho é um sentimento abençoado, e muitos elogios vêm recheados dele. Mesmo dando graças por ele e pelo incentivo recebidos, devemos fugir de elogios em excesso - tanto de ganhar quando de fazer.
Existe uma ligação muito estreita entre elogio e expectativa, e daí a comprometimento e cobrança, fontes seguras de ansiedade. Quando se têm irmãos, então, e nem todos elogiados na mesma medida, tem-se a garantia de muito desconforto e bastante problema pela frente. Até bem pouco tempo, pais e educadores em geral não costumavam se preocupar com os traumas dos menos incensados.
Quem, mesmo não tendo participado de nenhum concurso de beleza, não escapou de ler “O pequeno príncipe”, entende bem disso: se você cativa, pode até não conseguir ter nas mãos um prisioneiro, mas pode ter as piores intenções. Mesmo sem ter consciência disso, como ocorria com freqüência nas gerações pré-Freud, pode-se, com a mais cândida das intenções, estar fazendo um estrago. Existe, porém, uma sutil, embora abissal, diferença entre o elogio que incentiva e o elogio que corrompe e aprisiona - este último, geralmente copioso e sistemático, quase compulsivo. Aprisiona e cobra, cobra um comportamento que tem mais a ver com o padrão, o julgamento e a expectativa de quem enaltece do que com o sujeito da ação enaltecida. Sob o peso dos elogios, tudo pode ficar mais difícil porque a exigência é maior.
Não quero ser ingrata, talvez tenha sido melhor do que o contrário, mas é possível também que o estrago seja tão grande quanto o benefício. Sei que faz toda a diferença quando a fonte dos elogios é querida e confiável. Certamente existem amor e carinho em algumas palavras enaltecendo nossas possíveis qualidades, mas sinceramente prefiro em espécie, isto é, em demonstrações concretas desses sentimentos, quando necessárias ou oportunas.
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