sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

O destino


As granadas estouravam e as balas zuniam no dia em que cheguei à Índia. Tomei a decisão de começar a viagem por Delhi e terminar por Mumbai, mas segundo a nossa primeira reserva, estaríamos no Taj Mahal Palace que foi atacado, e esse blog poderia já não estar mais aqui. Nosso repórter valentão lamentou muito o fato de não poder mandar matéria literalmente no calor dos acontecimentos, mas como ele dependeria mais dos favores de um terrorista paquistanês do que da minha limitada produção, louvei nossa boa estrela.
Bombaim virou Mumbai, para infelicidade de muitos indianos, que não precisam de mais infelicidades do que as que já têm, sob a minha ótica pessoal, social e ocidental, mas que ainda por cima lamentam ver as cidades em que nasceram ou vivem rebatizadas –Madras virou Chenai, Benares virou Varanasi, Delhi tem nova no nome, mas continua Delhi, e continua velha.
Bombaim, ou Bombay, antigo nome do novo centro financeiro da Índia, vem do português, boa baía, e é um nome bonito. O país recebeu como herança dos tempos coloniais a língua inglesa, e agora faz muito uso dela, com os seus serviços e call-centers que conversam com o mundo – relutei em dizer que faz bom uso, só quem se esforça para entender o inglês falado por um guia indiano sabe do que estou falando.

Não só de bombas, espiritualidade, sujeira e injustiças sociais vive a Índia.
Está aberta a temporada de casamentos por lá, e isso aparecia a cada momento da nossa viagem. É só sair na rua, a qualquer hora, de qualquer dia da semana, para cruzar com um cortejo colorido e barulhento festejando a data mais importante na vida de um indiano. Tem para todos os gostos. Entrar num hotel, seja de quantas estrelas for, e ver a tenda armada. Abrir o jornal e ler os classificados. Dizer que é solteiro e ver a reação que provoca – todos vão querer te arranjar um - casamento! Talvez tenha sido a maior surpresa da viagem.

Nunca tive notícia de um povo na terra que procurasse tanto a orientação dos astros como os indianos, isso eu comprovei, e pode bem ser verdade que os reis magos tenham saido da Índia para homenagear Jesus que nascia na manjedora seguindo a estrela que os levou a Jerusalém, valorizando riquezas, ouro e presentes como eles bem valorizam até hoje.

Os indianos se casam fazendo um mapa astral, que precisa coincidir, e que leva em conta muitos antecedentes familiares.
É ainda um pouco confuso para mim o que tem mais peso, pois parece que misturam tudo nessa previsão pré-matrimonial, os astros, as castas, especialmente a divisão entre castas, banidas por lei há mais de cinquenta anos mas ainda totalmente presente na vida dos indianos. E conhecendo o jeitinho indiano, duvido que não haja uma conta de chegar para acomodar interesses. Mas o mapa é importante num país em que os pais procuram noivos e noivas para os filhos nos classificados de domingo, independente dos candidatos e candidatas já terem morado por muitos anos nos Estados Unidos ou na Europa, caminhando com as próprias pernas e trazendo um MBA debaixo do braço. Isso tudo está no anúncio, junto com a apregoada beleza física dos candidatos.
Além disso, depois que casam, não se separam, é o jeito com que se organizam. Podemos imaginar o que acontece extra-oficialmente, já que o peso e a determinação da cultura não costuma conseguir sufocar desejos e sentimentos, e o ser humano não pode ser tão diferente assim só porque nasceu na Índia.
Isso é regra geral, é claro que a Índia também tem suas exceções, e está mudando e se voltando muito rápido para o mundo ocidental, como nunca antes visto num país que se orgulha de ter a única cultura da antiguidade ainda bem viva no mundo – mesmo que isso signifique viver sob bombas trazidas frequentemente por paquistaneses radicais.

9 comentários:

Selma Boiron disse...

Sim, já 'estou' na India mas confesso q tb estou achando difícil compreender esse modus vivendi q vc presenciou, vivenciou e aqui nos relata. Post mais! Mais (belas) fotos! Quero continuar a 'viagem'!! E bem-vinda de volta, Amiga Blogueira :) Feliz Natal!

isabella saes disse...

Faço minhas as palavras da Selma: quero mais histórias sobre a terra de Gandhi!! Beijos.

vanda viveiros de castro disse...

Podem ter certeza que vem muito mais. Vou parar só o tempo necessário para as rabanadas...
beijos para Selma e Bella.

Anônimo disse...

Oi, Vanda,
Mesmo estando literalmente na India, estou curiosa para ler seus relatos sobre este país tão diferente para nós ocidentais! Beijos e Feliz Natal,
Elda

vanda viveiros de castro disse...

Que bom, Elda, prometo vários relatos indianos, e você pode conferir para ver se batem com suas impressões daí. Essa terra é mesmo diferente, mas mesmo assim parece ter muito em comum conosco -mas podem bem ser as semelhanças entre o terceiro mundo...
Feliz Natal! Beijos, Vanda

vanda viveiros de castro disse...

Oi Selma, gostei da novidade da foto! você virou blogueira também? Tomara! Beijos, Feliz Natal!

Selma Boiron disse...

Ah, q nada, num virei, não! rsrsrs Sou 'ledora' - como dizem lá no Benjamin Constant, leitora e só! Blogueira, não! Sou preguiçosa d+ pra isso! A foto foi pq descobri q podia ter uma cara aqui :) Já, já vou trocar rsrsrs

Anônimo disse...

Vandinha, acho que vai ter assunto para o ano novo quase todo....... e imagino que fotos também. até agora voce só pincelou!!me junto ao coro para pedir mais......
Essa mania de casamento é extraordinaria. Entao aqueles filmes de Bollywood ( é assim que escreve?) dao conta da realidade? Eles adoram casar e festejar o csamento.......
Outra curiosidade é o uso da astrologia.....
depois tem toda a parte espiritual, yoga, ai meu Deus........
Nao penso em colocar a India em possiveis planos de viagens futuras. Entao, boto fé em seu blog para esta excursao mágica....
bj
Assimina

vanda viveiros de castro disse...

Assimina, é isso mesmo, os filmes de Bollywood são mais pródigos em casamentos do que novela de tv, e lá entendemos porque, o mundo gira em torno deles, e chegamos em plena temporada casamenteira. Pode contar com os relatos de viagem, não precisa ir lá... não sei se saberei reproduzir as dificuldades, certamente essa foi a mais difícil que já fiz, por muitos motivos, não só pela Índia, mas ela contribuiu com sua parte! O mistério é que passado um tempo, a gente felizmente consegue guardar as coisas boas que viu, e consegue entender porque as pessoas voltam. Bjs!