sábado, 16 de março de 2013

Deitando na rede




Tem coisa melhor do que rede?
Nossa língua tem beleza como todas as outras, mas não tão é rica assim, a toda hora a gente sente falta de mais uma palavra.
Penso na rede mais nova, net, web, internet, essa aqui onde tanta gente labuta por ofício, por lazer ou desejo de se congregar com o mundo, com os seus pares.
Não se pode chamar essa rede de novidade, ela já nem mais engatinha, mas é ainda jovem, muito jovem, tanto que recebe gente nova todo dia.
Em outro tempo, a gente dizia, se referindo ao jornalismo impresso, que papel aceita tudo. Era uma sábia advertência para que os leitores mantivessem uma certa distância do que estavam lendo, mas mesmo assim até hoje se cai na armadilha sempre armada, vem com cara de verdade o que se vê impresso. Até quando sabe que quem imprime não é de confiança, e a gente identifica claramente muitas imprecisões ou distorções, mesmo assim tende a acreditar na página seguinte quando lê sobre o que não conhece, especialmente se o que lê vai de encontro ao que se quer acreditar, porque a gente pode ler noventa e nove opiniões contrárias mas tende a ficar com a única que nos interessa.
A rede é ainda mais democrática do que um jornal, aceita tudo mesmo, já que é muito mais aberta do que uma redação, não precisa de um emprego nem de um diploma, basta ter um teclado à mão, não é preciso nem ter um computador, coisa que muito mais gente já tem, mas basta ter uns trocados e entrar numa lan house, num cyber café. Deveria haver sempre um dicionário à mão de quem tecla, doeria menos ler o que a gente lê nessa rede, mas nada é perfeito, nem democracia.
Democracia é bom demais, mas como tudo, tem suas regras, ou anarquismo teria dado mais certo. A rede, democrática, também tem as suas, a gente vai aprendendo. Delícia das delícias escrever sem editor, escrever o que se quer. Mas seria sábio também lembrar e adaptar aqui um velho ditado: quem escreve o que quer, lê também o que não quer.
A rede é também rápida, quase instantânea, mas da mesma forma que televisão carrega cor e som mas não tem cheiro, a rapidez da rede nos leva a ser sucintos, cada vez mais, tudo curtinho e rápido, pouco ou nenhum tempo se gasta para pensar antes de escrever ou clicar. Além disso, cada cabeça uma sentença, o que se escreve não é igual ao que se lê, mesmo se tratando da mesmíssima coisa. Existe aí um hiato, e como não se pode ler pensamentos, adivinhar sentimentos, uma frase digitada também não traz junto o jeito, o sorriso, o calor com que é dita ao vivo, em carne e osso. Interpretações podem ser desastrosas.
O sucesso da rede pode ser inversamente proporcional ao fracasso fora do mundo virtual. Quem se expõe sabe: está exposto a qualquer tipo de interpretação, mesmo que escreva direitinho, tim-tim por tim-tim, quem lê pode não estar no mesmo espírito, não ter a mesma formação, a mesma intenção, a mesma cabeça, que o ser humano é complexo!
Blogueiros experientes sabem disso. Muitos não permitem comentários, da mesma maneira que muitos leitores preferem comentar ao vivo, não se sentem à vontade para se expor por escrito. A rede tem suas armadilhas, que podem ser implacáveis. A privacidade e a solidão do teclado muitas vezes induz a uma sinceridade muitas vezes inconveniente, e que pode custar muito caro. Liberdade de expressão são palavras ao vento, liberdade é coisa cara demais para ficar dando sopa por aqui. Tudo tem preço. Um pouco mais de sinceridade pode custar seu emprego, por exemplo, porque mesmo que o seu chefe não leia, pode ter certeza que sempre haverá um colega interessado em contar, geralmente interessado no seu lugar, ou apenas em agradar. Cuidado nunca é demais, melhor ter do que perceber tarde demais.
Blogueiros experientes também conhecem o que talvez seja o primeiro mandamento de quem escreve ou clica – e clicar o que nos chega é muito mais fácil do que alinhavar, concretizar e compartilhar um pensamento: estou falando de humildade, e da disposição de exercer plenamente o que muito poucos assumiriam ser contra, mas nem todos entendem ou aceitam, que é respeitar democraticamente, o pensamento do outro. Falar é muito, muito mais fácil que ouvir. E muito mais arriscado também. Não dá para ser autoritário, não dá para se levar demais a sério, ser dono da verdade, ingorar o sentimento alheio. É claro que existe sempre a opção de escolher o que se lê, de não ouvir, mas é preciso ser mesmo aventureiro para militar nessa rede, a trançadinha de algodão é muito mais confortável do que ficar aqui ao relento, no sereno!

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