quinta-feira, 17 de setembro de 2015
Notícias
Quando eu ainda buscava ideias de pautas, mais de uma vez, por motivações variadas, sugeri um programa em torno da felicidade – o que é - se existe - onde ou como encontrá-la, podemos viver sem ela ? ( "risos" para um formato que, pela longa permanência no ar, virou motivo de troça, para usar uma palavra de outro tempo).
Numa dessas vezes fui motivada pela resenha de um livro que argumentava justamente que a felicidade não é mais possível no mundo atual, já que ninguém é uma ilha e recebemos notícias de tragédias, tristezas e males vindos de todos os lados do planeta. Impossível ser indiferente ao que acontece na Síria, Irã, Iraque, em quase toda a África, se eterniza no Afeganistão, no Vietnã um pouco mais atrás, atrocidades sem nome e sem data, dentro e fora do mapa.
“Você parece carregar as dores do mundo” ouvi de um terapeuta e fiquei até hoje sem entender, porque a terapia foi curta e também porque como não sentir dor vendo crianças vivendo na rua, o que tinha sido o meu comentário ali. Então não é comigo? É comigo, sim, é com todos, muito mais até com os que não sentem que é com eles, mas o que fazer? Não ver? Não ler? Não fazer, já que uma gota não transforma um mar?
Comecei a separar: o que me interessa é o que é possível transformar com a mobilização que uma notícia tem o poder de provocar. Não é pouco, mas a cobertura dos fatos é feita seletivamente, e muito frequentemente, de maneira arbitraria. Vai ficando difícil, quase impossível encontrar isenção e honestidade no que se noticia, como é impossível achar um equilíbrio entre boas e más notícias. É mesmo desequilibrada a cobertura midiática.
Viciada em notícia desde criança, quando meu pai chegava com O Globo, para os quadrinhos que eu e meus irmãos seguiam, o Jornal do Brasil para todo o resto, O Cruzeiro quando atraía mais do que a televisão, que eu não via, outro dia, sem nenhum motivo aparente, me veio uma lembrança esquecida, da primeira redação em que trabalhei: logo que entrei no jornal fui escalada para selecionar notícias que importassem e que coubessem em pequenas frases, que eu deveria mandar para uma empresa que tinha um contrato com o jornal e as exibia, passando numa faixa luminosa, emolduradas pelo morro do Pão de Açúcar, uma cena que me chamava a atenção desde criança. Como pude esquecer?
Era por volta desse tempo que Caetano, o dos bons tempos, perguntava: “Quem lê tanta notícia?”.
As notícias andam mentindo muito, e eu não gosto de me enganar, por isso estou me voltando contra o tempo, o relógio, a atualidade, tenho agora mais prazer com coisas atemporais, incluindo aí as memórias que guardo, bem fora da ordem. E falando de mim posso estar falando de muita gente, mesmo não esquecendo de quem precisa ou insiste em lidar com as últimas notícias, mas em tempos de infelicidade quase plena, o caminho pode ser seguir o clichê: olhar para as pequenas coisas, e deixar o mundo um pouco de lado.
Uma biografia de Saint-Exupéry – quinhentas e tantas páginas, em inglês, com letrinha pequena, rende que é uma beleza, leio aos poucos para, a cada volta, mergulhar nas suas aventuras, hora no deserto, hora no ar, em Paris, na África ou na América do Sul. Nas asas da Aeropostale, que voaram antes que as da Panair – e essa é outra história boa de ler.
Um pensamento do escritor acima me pareceu particularmente atual – ele falava de um momento, na década de 30, na Europa, em que o mundo estava virando um lugar cada vez menos hospitaleiro:
“O essencial é continuar vivo. Não podemos esquecer disso, mas hoje os viventes são obrigados a se defender como se estivessem sendo ameaçados o tempo todo”.
Vivemos muitas batalhas e ataques por aqui. As guerras, as ameaças, mudam de endereço, mudam de padrão e muitas vezes se repetem sem que muita gente se dê conta. A culpa é toda das notícias, que não dão conta de nos contarem o essencial.
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