domingo, 17 de janeiro de 2010
Humanos
Li, em algum lugar que não lembro agora, mais um belo ditado vindo da África, continente que já nos ensinou tanto: “Se quer chegar rápido, vá sozinho. Se quer ir longe, vá com os outros.”
Penso que escrever é essencialmente um ato de doação e procura.
Escreve-se por vários motivos, por ofício, pela necessidade que um talento tem de transbordar, por exibição, por afirmação, pela nobre iniciativa de partilhar o conhecimento, pela busca de afinidades, mas independente de talento ou resultado, quem escreve não quer ficar sozinho. É sempre uma mão estendida para quem lê. Mesmo que seja para uma só pessoa, é a expressão de um pensamento de quem quer ir além de si mesmo.
Eruditos se voltam com muita frequência para sua própria erudição, e acabam fechados e afastados, desinteressados mesmo por quem não acompanha ou compartilha seu apromoramento. Portanto, ter talento apenas não opera mudanças, não basta cultura e conhecimento para que a humanidade evolua, vontade de partilhar é a questão fundamental. Talvez por isso a evolução humana seja tão vagarosa, e acabe tendo mais sucesso na comunicação com as massas quem faz isso movido por algum interesse mais palpável e imediato, menos altruísta. Generosidade é a ponte, e tem mão dupla: aprendemos e assimilamos o que queremos absorver, o que permitimos que nos emocione. Como um bonus, quem não se fecha tem mais chance de se enriquecer e se aprimorar com as trocas.
Qualidades humanas de naturezas diferentes.
Enfrentar uma lauda ou uma tela em branco, coisa impossível para alguns, pode ser muito fácil para quem tem talento – mais fácil, muitas vezes, do que virar uma página.
Todos estamos abalados com o drama haitiano, esse país-vítima desde que se entende por nação, é não é certamente por um problema de religião ou raça.
Raça, a negra já mostrou que só não é mais forte do que pólvora e concreto. Religião tem servido de instrumento, através dos tempos, para governos ditatoriais e manipuladores. Países católicos, países islâmicos sabem disso. A geografia, pela localização estratégica, ao longo dos séculos, fez do Haiti um país-vítima muito antes do terremoto. Seria um pequeno consolo saber que os milhares de mortos pelo menos conseguirão despertar uma consciência maior para permitir que mais gente entenda porque é que o Haiti é tão pobre e indefeso. Essas considerações, junto com o trauma e o desconhecimento da língua, talvez sejam uma explicação mais plausível para a declaração do cônsul haitiano no Brasil, que vi anteontem na rede. A natureza humana é complexa e diversa, mas vou morrer sem aceitar fácil que possa ser tão perversa.
O Haiti se tornou a primeira república negra no mundo, em 1804. Um país tão pequeno ameaçou o mundo escravagista, e enfrentou por isso um boicote mundial por mais de sessenta anos liderado pelos (norte)americanos, que também apoiaram dois ditadores haitianos por três décadas. Acabaram abandonando a agricultura de subsistência para importar arroz dos EUA, passaram por um golpe que depôs o presidente, tudo isso aconteceu com a conivência da "elite" haitiana. Essa história não parece muito diferente da nossa. Pensando bem, pode ser mesmo muito perversa e pervertida a natureza humana.
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