sábado, 12 de janeiro de 2008

Notícia


Tenho médicos e médicas, de várias especialidades, com quem me consulto há um bom tempo, e com o passar dos anos a relação profissional acaba virando uma relação de amizade. Costumo e gosto de conversar com todos, especialmente com um, que tem o curioso vício de assistir telejornais. Ele pula de um canal para outro, acompanhando os noticiários que escolheu para sua rotina diária, desde muito cedo e durante todo o expediente, mesmo dentro do consultório. Não é motivado por celebridades televisivas, não é esse o interesse dele.
É um médico antigo, dos que tratam os pacientes de modo individual e humano.
Sempre me irritei com televisões ligadas em salas de espera, lugares onde tradicionalmente ficamos postos em sossego, e algum atraso costuma ser até bem vindo por dar chance a um pouco de leitura – não me refiro à fatídica folheada na revista Caras, arroz de festa nas salas de espera.
Mas com a televisão ligada dentro da sala do médico já me acostumei, e é sempre motivo de conversa. Pergunto se ele não se estressa com a quantidade de notícias negativas que vê, já que é esta a preferência dos noticiários, mesmo que não assumam que é uma escolha sensacionalista ou direcionada, apenas disfarçada em maior ou menor escala. Pelo contrário, ele se distrái assim. Gosta de notícia. Mas o que me deixa ainda mais intrigada é perceber que ele não concorda com as idéias da maioria do que assiste. É, na verdade, extremamente crítico com o que vê. Continua assistindo muita coisa que não concorda e não se abala. Mas fica no maior entusiasmo quando descobre um telejornal que considera bom. Quando chega em casa, tem ainda três jornais para ler...

É pura ilusão achar que podemos pensar pelos outros.
Uma pessoa pode não ter desenvolvido a atividade de pensar e de tirar conclusões, mas ninguém escolhe terceirizar seu pensamento. E se desconfiar que pode estar sendo manipulado, perde a confiança no que vê. É verdade que se acredita no que se decide acreditar, e as pessoas entendem o que estão interessadas em entender. Conversando com uma pessoa de muito baixa escolaridade e muito pouca leitura, ela me dizia que não entendia as notícias de um telejornal. Eu perguntei se ela não entendia ou não se interessava. Ela ficou completamente surpresa e me disse que realmente, achava que aquilo não tinha nada a ver com a vida dela. Culpa dela ou do telejornal?
A relação do espectador ou leitor com a notícia é imprevisível. Se o velho dito popular afirma que nunca se sabe de antemão o que vem de uma barriga de mulher grávida ou de uma urna, eu digo que nunca se sabe a reação que uma notícia causa, nem com todas as pesquisas do mundo.

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